quinta-feira, 22 de abril de 2010

Arte de Rua

quinta-feira, 22 de abril de 2010

Em meio ao barulho do trânsito paulistano, um palhaço se comunica com os motoristas por mímica, lembrando-os de usar o cinto de segurança. Perto dali, um muro grafitado colore o caminho estreito e apinhado de gente. A arte está nas ruas de São Paulo, embora a população, quase sempre apressada, muitas vezes não a perceba. 

Diversas manifestações artísticas utilizam as formas urbanas como suporte, transformando viadutos, túneis e avenidas em museus a céu aberto. “Por dia, milhares de pessoas passam em frente ao graffiti pintado numa estação de trem, fato que não ocorre com as obras expostas em galerias de arte”, diz Rui Amaral, um dos primeiros grafiteiros do Brasil. 

A cidade cinzenta vai, aos poucos, adquirindo o colorido do graffiti e conquistando o interesse de novos artistas. Hoje, São Paulo possui cerca de mil grafiteiros, bem mais do que há trinta anos, quando só dez artistas eram vistos com os seus sprays nas ruas. Péti Márcio, um dos novatos no graffiti, diz ter se surpreendido com as pinturas nos muros da cidade. “Eu percebi a possibilidade de envolvimento com a rua, com o lugar em que vivo. Eu me sinto feliz quando estou fazendo isso” contou Márcio. 

Apesar do entusiasmo dos grafiteiros, os muros da cidade tiveram algumas pinturas apagadas pela Prefeitura da capital, há cerca de dois anos. Na época, como forma de resistência, os grafiteiros criaram a Bienal de Arte de Rua de São Paulo, a BIAR, que tem a sua primeira edição prevista para o próximo ano. Entre os preparativos para o evento, diversas ações coletivas acontecem nas ruas de São Paulo. “A idéia é fazer várias intervenções na cidade ao longo do ano, com trabalhos no Minhocão, no Buraco da Paulista e na periferia. Em 2011, vamos fazer uma exposição no MAC (Museu de Arte Contemporânea), com foco em educação, cidadania e cultura”, conta Amaral. 

A pintura compõe o cenário urbano com outras expressões artísticas, como o teatro, que transforma o asfalto em palco e traz novos personagens ao cotidiano da cidade. O sinal vermelho é como o abrir das cortinas para o palhaço argentino Javier Picasso, que flagra, com muito bom humor, motoristas desatentos às leis de trânsito. Numa das ruas mais movimentadas da capital paulista, a Augusta, Picasso adverte, por meio de mímica, condutores e passageiros sem o cinto de segurança. 

Em apenas dez minutos, o palhaço flagrou cinco veículos com pelo menos um dos ocupantes sem o cinto. Um deles foi a jornalista Cristiane Nociti, que, com bom humor, se desculpou com o palhaço. Ao ser questionada pela reportagem sobre o esquecimento do item obrigatório de segurança, brincou: “não vai dizer que eu estava sem o cinto, hein?”. 

Nem sempre as mímicas do palhaço são bem recebidas pelos motoristas. Se, por vezes, Picasso tem o seu trabalho reconhecido, recebendo alguns trocados como forma de agradecimento pelo “puxão de orelha”, há casos de agressão verbal e física. Com gestos, Picasso diz ter sofrido maus tratos até mesmo de policiais, que não entendem o seu trabalho nas ruas. Apontando para o nariz, faz mímica, dizendo que eles, os policiais e os motoristas ranzinzas, são os verdadeiros palhaços. 

A arte de rua muda a paisagem urbana, mas essa transformação acaba esbarrando num velho e conhecido problema brasileiro: o acesso à educação de qualidade. “A maioria das pessoas não possui as ferramentas necessárias para compreender a arte”, diz a artista plástica Alessandra Iório, que já lecionou em escolas e ONGs. “Nas aulas de artes, as crianças estão aprendendo a fazer bandeirinhas para o dia da Independência”, complementa Iório. A arte está nas ruas, porém é preciso oferecer condições para que a população a reconheça. (Fotos: Antônio Carlos Castejón, Adriano Rangel)

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